domingo, 24 de fevereiro de 2013

Poema de uma das etapas do II Concurso Autores S/A de 2012





Imagem: dcenadaimpossivel.word...

O poeta Está Morto

O poeta de mãos calosas
sob a pele do operário
deglute, à seco algum verso
e guardanapo;
junto aos trocados da pinga
que queima na goela
como o pó da fábrica
e, no bolso, o mísero ordenado
minguado, em combustão espontânea.
Um olho que lacrimeja,
efeitos do risco químico,
o outro é angustia da boa,
que molha e à barba por fazer
mal disfarçada por óculos obrigatórios.
Zumbis mal-sepultos
assombram-lhe a madrugada
na fila do ônibus
seus sonhos penhorados.
O barulho da catraca dita o ritmo
e marca o passo dos solavancos
onde a dama/marmita
fria e única que se é permitida
tirar para dançar
nos países em desenvolvimento.
Findo o expediente, é hora de ir à forra
no intrincado e perigoso
Jogo das putas e outras damas mais suspeitas...
e a literatura espoliada
chora a morte de um vate
último romântico
de sua espécie.



domingo, 17 de fevereiro de 2013

3º Lugar no XVII Concurso Literário Internacional ALPAS XXI




O Não Pertencimento

Não sou pertencente a lugar nenhum, cidade alguma
cidadão oco, vazio. Copo trincado
em fim de orgia, sem corpo.
Fluido, gás helio, balão incolor
vago além da atmosfera.
Divirto platéias, palhaço e louco
envergonho a família, a classe, o povo
a humanidade inteira.
Enlouqueço a Tradicional Família Mineira
com meu sotaque carregado de uais,
pensamentos singelos, mas elegantes,
um tigre a desfilar seu garbo
entre búfalos e elefantes.
Não me querem assim, não me querem vistoso
pavão, garanhão marchador. Assim não me querem
os pais, os avós, professores, o pároco, o prefeito.
também a primeira namorada, o boi que rumina ao largo
o coelho a espiar dum buraco do chão, todos
me querem simples, um inseto, uma tábua
um alfinete ou um dedal, inofensivo, insignificante .
Deslocado, anacrônico, insípido.

Mas qual, se não me permito a doma,a  arreata,
tampouco a ordenha, cintos a estrangular libidos.
Sou livre, sou leve, sou gás...

3º Lugar no XVII Concurso Internacional de Poesias, Contos e Crônicas da Associação Artística, Literária e Multiprofissional "A Palavra do Século XXI" (ALPAS 21) - Cruz Alta (RS) - maio/2012.

Francisco Ferreira

francisco.ferreira68@yahoo.com.br


sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Finalista Concurso Maricá Prosa e Verso




Lenitivo
A vida é dor
Nasce-se com ela
Estratificada, pregada...
Somos jogados no mundo
Á nossa própria sorte e arbítrio
Assolados por tentações e intempéries.
Recebem-nos mãos estranhas
Frias, em ambiente hostil.
O oxigênio nos caustica
Nem bem sugamos o colostro
E já nos querem vestir
Limpar, apalpar, furar.
Monta-nos o cocuruto, o diabo,
A sorrir de nossas desgraças
E nos desviar do caminho
Viciar, seviciar e escarnecer!
E, ao Coxo, alinhados pais, professores
O pároco, a polícia e as putas;
Psicólogos a nos “desenquadrar”
E o soldado, que nos enquadra.
O papa excomungando e todo o clero
Que nos exorta a viver acordes
A uma doutrina carregada de medos
Castigos e condenações
Até a dor ser tamanha, que morremos!

Ou nos enveredamos pela poesia...


Classificado entre os finalistas do Concurso Maricá Prosa e Verso em novembro de 2012, conforme e-mail recebido da Comissão Organizadora do Concurso em 20/11/2012.

Francisco Ferreira

francisco.ferreira68@yahoo.com.br


terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

3º Lugar no Concurso Libério Neves de Poesia




Brasilidade

Meu sangue mestiço, de latinidade pura
é viscoso feito óleo, é pegajoso visgo de jaca.
Alguns elementos químicos estranhos o contaminam
resquícios de algum malogrado bem-querer,
saliva e sódio do sal do último churrasco.
Alguns gramas de chumbo de emboscadas atravessadas incólume,
sebo de carneiro de ferimento antigo,
óleo de Copaíba, mercurocromo, mertiolate e sulfa
e porções de substâncias proibidas.
Espesso como cheiro de fêmea, denso de florestas tropicais.
Gotículas, aqui e acolá, de revolta, ira e desespero.
Um tantinho de bile, cachaça e fumaça de charuto
de despacho que, distraído, derribei em esquinas suspeitas.
Maleita não tem, AIDS, tifo, tuberculose, diarréia também não.
Quiçá cocos de doenças de rua...
Tem desejos meu sangue, traços de canto inconcluso,
rastilhos de poesia e o eterno tédio dos homens comuns
e o banzo ancestral, além de acordes de banjo...
Tinta de carimbo de alguma repartição, e um bom bocado de burocracia
descrédito e desconfiança asco e terror.

É um sangue comum, destes que não fedem nem cheiram,
mas que deságua, de geração em geração,
em brasileiros obstinados!

3º Lugar no Concurso Libério Neves de Poesia da Associação Comunitária de Moradores de Conjunto Califórnia (Belo Horizonte- MG) em outubro de 2012.

Francisco Ferreira

francisco.ferreira68@yahoo.com.br